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STJ – Os desafios para a implementação efetiva da Lei 13.709/2018, que trata da proteção de dados pessoais e foi promulgada no ano passado, estão sendo discutidos desde a manhã desta segunda-feira (27) no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em um evento que reúne magistrados, professores de direito e outros especialistas.

O seminário internacional Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD): a caminho da efetividade foi aberto com a presença do presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha; do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli; do presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Fernando Mendes, e dos coordenadores científicos do evento: o ministro do STJ Villas Bôas Cueva e os professores Danilo Doneda, do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), e Laura Schertel Mendes, da Universidade de Brasília (UnB).

João Otávio de Noronha disse esperar que o seminário transcorra em clima de pesquisa, debate e informação. O ministro Villas Bôas Cueva alertou sobre a relevância e urgência do tema, face à emergência do que chamou de “capitalismo de vigilância”, isto é, “um sistema econômico que possui, como um de seus ingredientes, os dados pessoais” – os quais alimentam a nova economia digital.

“Esse seminário foi organizado para discutir algumas das questões mais prementes a serem esclarecidas, a fim de que a LGPD possa rapidamente se tornar efetiva”, destacou o ministro.

Dias Toffoli lembrou que a LGPD fundamenta-se em diversos valores, como o respeito à privacidade, à liberdade de expressão, de informação, comunicação e opinião; à inviolabilidade da intimidade, honra e imagem; ao desenvolvimento econômico e tecnológico; à livre concorrência e defesa do consumidor, bem como à dignidade das pessoas, entre outros. “Todos têm a ideia central de resguardar o cidadão contra o uso abusivo e indiscriminado dos seus dados pessoais”, afirmou.

Os painéis estão sendo transmitidos ao vivo pelo canal do STJ no YouTube.

Mudanças tecnológicas

O professor Tércio Sampaio Ferraz Júnior, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), foi o primeiro expositor do painel “Rumo a um direito fundamental à proteção de dados pessoais”. Ele destacou o cenário de mudanças tecnológicas e os reflexos na proteção das informações pessoais.

“O direito tem buscado interpretar essas inovações, mas ainda há pouca jurisprudência sobre o assunto. Nos Estado Unidos, por exemplo, buscou-se trazer a ideia de propriedade de bem móvel para a questão de senhas, mas tal conceito não se adapta inteiramente porque a informação não é bem móvel”, comentou Tércio Sampaio sobre os desafios de interpretação da LGPD.

Segundo a professora da UnB Laura Schertel Mendes, aprovar a lei foi um desafio, mas interpretar e torná-la efetiva é um desafio muito maior. Ela destacou que essa complexidade se deve, em parte, ao fato de não ser possível identificar quem é o dono das informações em muitos casos, principalmente quando se faz um contraponto com conceitos como a noção de autodeterminação informativa, termo utilizado inicialmente pela suprema corte da Alemanha em 1983.

“A jurisprudência alemã não parou e evoluiu a partir do conceito de autodeterminação para estabelecer condições mínimas do fluxo de dados. São as novas respostas que a sociedade da informação exige.”

Para Laura Mendes, a LGPD irá suscitar questões a respeito da efetividade da Constituição de 1988 na proteção de direitos como o da autodeterminação informativa. O primeiro painel foi moderado pelo ministro Villas Bôas Cueva.

Elementos harmônicos

O segundo painel – “A relação entre a LGPD e demais normas: em busca de um sistema harmônico de proteção de dados” – destacou conceitos que serão trabalhados a partir da vigência da Lei 13.709/2018.

O professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) Danilo Doneda afirmou que a lei é apenas um “pontapé inicial” na busca por uma regulamentação do assunto. Ele lembrou que 132 países já adotaram algum tipo de lei de proteção de dados, e muitos têm elementos harmônicos entre si.

“A lei brasileira surgiu com as experiências internacionais em mente. Do texto-base proposto em 2010 até a versão final, houve uma tropicalização do texto. Essa é a tendência normativa, e o país que fugir disso corre o risco de se tornar um pária internacional.” O professor destacou ainda a importância da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) como organismo responsável para efetivar a lei.

A professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Cláudia Lima Marques lembrou que a ANPD não pode estar conectada a apenas um órgão governamental. De acordo com a professora, a implementação da lei é uma questão complexa devido ao conflito de normas.

Ela citou a teoria do diálogo das fontes ao discorrer sobre a tentativa de resolver a antinomia entre leis gerais e a LGPD. “Essa é uma lei transversal revolucionária. Todas as outras vão se adaptar. É preciso fazer o diálogo das fontes para evitar injustiças”, comentou Cláudia Marques sobre o cenário de adaptação da LGPD com normas como o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil.

Lei inédita

A gerente de políticas públicas e privacidade do Facebook Brasil, Nathalie Gazzaneo, disse que a lei de proteção de dados já traça alguns caminhos para a harmonização e aborda a questão da proteção de dados de forma sistemática – algo inédito.

“A possibilidade de harmonização da lei de proteção de dados está ligada à constituição de uma autoridade que possa de maneira eficiente garantir autonomia e assegurar o diálogo com os outros ramos do direito”, comentou a representante do Facebook sobre a importância de a ANPD sair do papel.

Ao encerrar o segundo painel, o professor Ricardo Morishita Wada, moderador, disse que todos esperam que a harmonização da LGPD no ordenamento jurídico seja melhor do que algumas experiências passadas, como a vivida na época do CDC. Ele destacou a importância do seminário como forma de garantir a integração entre a legislação e a prática.

O evento, que segue até esta terça-feira (28), é uma parceria entre o STJ, o Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF), a Ajufe, o Centro de Direito, Internet e Sociedade do Instituto Brasiliense de Direito Público (Cedis/IDP) e a FGV Projetos.

Como visto em: http://www.stj.jus.br

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